Outras Ideias com Walker Campos Pinto
De um lado, as traves, a bola, o gol. Do outro, o microfone, o rock e o som. No centro do campo da vida de Walker Campos, o amor aos pais, à esposa Andréa e ao filho Diego. “Sou um cara sentimental”, revela ele, ao término da entrevista, comentando dos amigos que se foram e da importância da casa em sua trajetória. E foi quase no quintal que sua profissão começou. “Ia muito ao campo do Tupi com meu pai. Quando ele estava em serviço no quartel, meus irmãos me levavam. Lembro muito dos jogos contra o Atlético. Era incrível ver o Éder, o João Leite. O campo de Santa Terezinha estava sempre lotado, era muita emoção”, lembra.
Nascido no bairro onde funciona o estádio do Carijó, Walker jogou futebol, defendendo o gol, nas categorias de base da cidade e foi campeão de futsal, na mesma posição, pelo Colégio Tiradentes na década de 1980. Nascia, então, o amor pelas chuteiras, que hoje combina com as vestes pretas com que trabalha, durante o dia, treinando os goleiros do Tupi e, à noite, cantando rock. Adereço constante, o fone de ouvido completa o visual. No play, Europe, Bon Jovi, Deep Purple, Whitesnake e outros astros do hard rock. “Tem outros goleiros roqueiros, como o Cássio do Corinthians e o Rogério Ceni, que pede para tocar AC/DC antes de entrar em campo.”
Da arquibancada para o campo
Do talento expresso entre as traves, começou com trabalhos sociais, fez estágios, cursos de treinador e obteve o registro profissional como educador físico, até ingressar, em 1999, no time do coração. “Entrei para o Tupi nas categorias de base e, à noite, cantava em bailes. Não conseguia largar esse lado. Em 2006, entrei para o profissional do Tupi e parei com a música em 2002. Resolvi estudar, tive que trancar por conta das viagens e me formei em educação física em 2011”, conta. Há 16 anos no clube, orgulha-se de cada instante. “Saí da arquibancada para ser campeão com o Tupi. Sou torcedor mesmo. É um amor muito grande pelo clube – e dedicação também. Um dia vou ter que sair, mas não gosto nem de pensar.”
De preto, com ou sem microfone
Aos 47 anos, Walker ri ao se recordar dos tempos em que ostentava uma enorme cabeleira, calças justas e camiseta, ao estilo dos ídolos roqueiros. “Cortei já faz muitos anos. Nosso visual era muito diferente, queríamos ficar mais próximos dos norte-americanos”, diz, referindo-se aos amigos com quem dividia palco. “Comecei a ter banda em 1983, com um amigo. Ensaiávamos em Bicas e, quando ele foi embora para os Estados Unidos, dei um tempo. No final da década de 1980, eu e outros amigos montamos a banda Icarus”, lembra o líder do grupo que, na região, tornou-se bastante conhecido. “Um cara me viu cantar na Icarus e resolveu montar, no Rio de Janeiro, o Led Zeppelin Cover. O Emmerson Nogueira tocava com a gente. O empresário era grande, queria fazer programas de TV, mas eu resolvi me casar. Queria uma vida estável. Apesar disso, nunca saiu da minha cabeça querer gravar um disco”, comenta Walker, que em setembro, no segundo Tributo a Wallace Santiago, ex-integrante da banda, retorna aos palcos com a Icarus Return, que reúne, além dele como vocalista, Xand Silvaglio (baixo e vocal), Georges Sabbagh (guitarra), Jean Paul (guitarra), Gabriel Rezende (bateria) e Rubens Müller Rocha(tecladista).
Só água
O tempo mudou muito mais que seus cabelos e vestes. Entre os treinadores de goleiros, segundo ele, “não existe mais a figura do chutador de bola”. “É necessário zelar pela integridade física deles, mas também pensar no lado psicológico. No futebol, dizemos que goleiros são seres diferentes. Eles ficam solitários e, às vezes, quando sai um gol, também vibram sozinhos. É preciso que eles tenham uma cabeça boa para manter o nível elevado”, analisa. Da mesma forma, os roqueiros já não são mais as figuras polêmicas e controversas. E a voz de Walker, em toda a sua calmaria, é prova de seu sentimentalismo e ternura. Ele não usa drogas nem bebe cerveja. “Só água”, assevera. E, além de superfamília, também é religioso. “Fui criado na igreja católica, rezo meu terço que aprendi com minha mãe. Sou fã de Nossa Senhora, Jesus Cristo e Deus. Não abro mão disso”, diz. Walker segura a bola, só não segura a emoção. No campo da sensibilidade, é um goleador.