Assaltos deixam comércio acuado
A ação de ladrões em estabelecimentos comerciais tem levado os comerciantes a mudarem os hábitos, como baixar o horário de fechamento ou dar preferência para trabalhadores do sexo masculino no período noturno. No entanto, os assaltantes têm ficado cada vez mais ousados, agindo até mesmo em momentos de grande movimentação e disparando tiros durante as ações. Entre os comércios mais visados estão padarias, mercearias e mercados. Na semana passada, a dona de uma bombonière foi baleada nas costas durante um assalto a sua loja, no Bairro Santos Dumont, na Cidade Alta. Na semana de 11 a 15 deste mês, pelo menos outros sete estabelecimentos comerciais da cidade foram assaltados em regiões diferentes, deixando ainda mais inseguros os lojistas.
Ontem a Delegacia Especializada de Repressão a Roubos divulgou que conseguiu capturar um adolescente de 14 anos e um jovem, de 24, suspeitos de envolvimento no caso da bombonière. Os suspeitos foram detidos na manhã da última sexta-feira, menos de 24 horas após o crime, mas só ontem o caso foi divulgado para a imprensa.
A Tribuna também esteve no estabelecimento um dia após o caso, quando encontrou as marcas de sangue ainda presentes no chão. Assustada, a filha da mulher baleada estava sem forças para limpar o estabelecimento. O roubo aconteceu na tarde da última quinta-feira, na Rua Professor José Barata, no Bairro Santos Dumont, quando a comerciante, de 54 anos, ao achar que o assalto era de brincadeira, foi baleada nas costas.
A filha da vítima, Aline Pereira, 33 anos, contou que três jovens entraram na loja e anunciaram o roubo. “Ela pensou que eles estavam brincando e estava confiante. Mas mostraram a arma e repetiram: “Tia, é um assalto”, relatou Aline, acrescentando que os ladrões abriram a geladeira, retiraram refrigerante e pegaram um pacote de biscoito recheado. “Quando minha mãe foi impedi-los, um deles apontou a arma na cara dela. Ela foi abaixar o braço dele, quando ele disparou”, contou a filha, que tinha deixado o estabelecimento segundos antes com o seu bebê.
Conforme Aline, sua família mora ao lado da bombonière há mais de 20 anos e que a loja funciona há seis. “Estamos com muito medo. Só minha mãe, quando sair do hospital, decidirá se vai manter o estabelecimento. Resta-nos, por enquanto, a insegurança. Esses meninos estão roubando por causa do crack e agem dessa forma, porque sabem da impunidade.”
De acordo com a titular da Delegacia de Repressão a Roubos, Patrícia Ribeiro, o terceiro envolvido no caso já foi identificado. “Agora vamos trabalhar para localizá-lo.” O adolescente foi acautelado no Centro Socioeducativo, e o rapaz foi levado para o Ceresp, já que havia um mandado de prisão temporária contra ele. “A Justiça colaborou, deferindo o pedido de prisão com agilidade. No dia seguinte ao crime, numa diligência, a equipe localizou os dois suspeitos”, enfatizou Patrícia. Segundo ela, o adolescente contou que o rapaz com a arma de fogo se assustou, porque a vítima teria esboçado uma reação e começado a gritar. “Na fuga, ele ainda fez um novo disparo, que até poderia ter atingido outra vítima, porque, quando ela gritou, diversas pessoas apareceram”, relatou a delegada com base no depoimento do adolescente. Conforme Patrícia, chamou a atenção o fato de o adolescente ainda possuir corpo de criança e alegar que não tinha intenção de parar com o crime, afirmando que é usuário de drogas e traficante.
Outros casos
Nos últimos casos, até mesmo clientes foram ameaçados e roubados no comércio. Um consumidor, inclusive, perdeu R$ 7 mil durante assalto a uma distribuidora de bebida. Em outra ocorrência, o cliente foi trancado junto com o proprietário em um escritório, enquanto os ladrões praticavam o roubo.
Em todos os registros, armas de fogo foram usadas, o que está assustando ainda mais quem trabalha no setor. Em alguns casos, a rotina dos estabelecimentos tem sido alterada para burlar o medo. Para proprietários e funcionários, o aumento no número de assaltos acontece na mesma proporção em que cresce a ousadia dos criminosos, que já não se importam mais com câmeras de segurança, e muitos agem “de cara limpa”.
Dados da Polícia Militar comprovam o aumento dos roubos na comparação entre 2014 e 2015. No segmento dos supermercados, por exemplo, os casos registrados de janeiro a abril saltaram de 14 para 20. Contra as padarias, os assaltos passaram de 17 para 20, enquanto, nas casas lotéricas, de dois para quatro. As padarias têm sido um dos pontos mais ameaçados. Levando-se em conta todo o ano passado, foram 43 ocorrências.
‘Não temos nem prazer em trabalhar’
No ramo das padarias, a insegurança está levando o dono de um estabelecimento no Nova Era, Zona Norte, a repensar se compensa manter as portas abertas 28 anos após a inauguração da loja. Nesse tempo, já foram quatro assaltos, sendo que os três últimos aconteceram nos últimos dez meses, todos registrados pelas câmeras de segurança. “Não temos nem prazer em trabalhar. O que mais eu penso hoje é se vale à pena manter a padaria aberta e colocar nossa vida em risco”, diz o proprietário, que preferiu não ter o nome divulgado.
O assalto mais recente na padaria do Nova Era aconteceu no dia 11 de maio, quando um homem armado de revólver e com o rosto coberto entrou no local e anunciou o roubo, por volta das 19h. Era uma segunda-feira, e, além dos funcionários e do proprietário, havia pelo menos quatro clientes no estabelecimento. O dono estava do lado de fora e foi rendido pelo bandido, sendo levado para dentro da padaria. Em poucos segundos, o ladrão levou cerca de R$ 1 mil do caixa, fugindo em seguida.
As ações dos bandidos no estabelecimento são ousadas. No assalto ocorrido em julho do ano passado, por exemplo, o trio de criminosos chegou a abaixar as portas do comércio para agir sem ser percebido. Eles ficaram no local por cerca de dois minutos. No outro assalto, em outubro, o bandido levou todo o dinheiro do caixa, onde estava uma funcionária. Em todas as ações, os suspeitos estavam encapuzados e armados com revólver. “Estamos tremendo. Não vemos carros da polícia passar”, diz o dono. Conforme o empresário, a falta de iluminação na Rua General Almerindo da Silva Gomes, onde fica a padaria, aumenta a insegurança.
O temor não está limitado aos bairros, ele também se faz presente na região central. De acordo com o dono de uma padaria na Rua Santo Antônio, a insegurança é grande entre os trabalhadores. Preferindo não se identificar, ele contou que, para inibir a ação de ladrões, passou a deixar somente atendentes do sexo masculino no balcão e no caixa, a partir das 18h, já que o estabelecimento permanece aberto até as 21h. “A presença de homens nestes postos acaba desencorajando alguns assaltantes, pois eles sabem que as mulheres são mais fáceis de intimidar”, disse o proprietário, acrescentando que a proximidade com o Parque Halfeld é um fator a mais de preocupação. “Infelizmente o parque funciona como atrativo de pessoas mal intencionadas. Virou ponto de tráfico de drogas, de consumo de bebidas e prostituição. Acaba servindo de ponto de observação para ladrões. De lá, eles olham a rotina dos estabelecimentos e estudam a melhor forma para assaltar.”
Lojistas devem evitar manter rotina
Três homens armados invadiram uma distribuidora de ferro e aço, no Bairro Santa Cruz, na Zona Norte, no último dia 14. Eles agiram no período da manhã e roubaram R$ 18 mil. O crime foi registrado por volta das 10h30 na Rua Miguel Marinho. De acordo com o proprietário Amaury Coelho, 62 anos, o trio entrou no local e anunciou o roubo.
Além dele, havia dois funcionários e um cliente no local. “Eles colocaram o revólver no meu ouvido. A toda hora, diziam que iriam matar alguém. Não há como reagir. Estamos nos sentindo indefesos, como passarinho”, relatou a vítima, completando que há 30 anos está naquele ponto e que foi assaltado pela primeira vez. Depois das ameaças, o comerciante e o cliente foram levados para o escritório, onde ficaram trancados. Os dois funcionários conseguiram escapar e acionar a polícia.
“Na realidade, não temos proteção”, disse Amaury, lembrando que o estabelecimento possuiu câmeras de monitoramento eletrônico, medida que não tem adiantado. Os ladrões levaram R$ 2.600, que estavam em sua carteira. Já na parte superior do estabelecimento, eles localizaram uma pasta onde estavam guardados R$ 15.400. De posse do dinheiro, os criminosos fugiram.
Um dia depois, R$ 13 mil foram levados no assalto a uma distribuidora de bebidas, no Poço Rico. Por volta das 18h30, dois criminosos armados entraram no estabelecimento, na Rua Viscondessa Di Cavalcanti, e renderam as vítimas, levando R$ 6 mil do dono e R$ 7 mil de um cliente.
Segurança
A titular da Delegacia Especializada em Repressão a Roubos, Patrícia Ribeiro, orienta as vítimas a jamais reagirem. “No caso da bombonière, por exemplo, a vítima gritou, e isso acabou culminando com o tiro. Às vezes, o criminoso nem tinha a intenção de atirar”, advertiu a delegada. Ela orienta a não manter valores altos nos estabelecimentos. “Na semana passada, desvendamos o roubo contra uma empresa no Bairro Aeroporto e vimos que um funcionário indicou o dia e o horário que haveria dinheiro no local. Então é preciso ter cuidado até na hora de contratar alguém.”
Outra dica é tomar cuidado com a rotina. Ela deve ser evitada, já que os ladrões observam isso. “Em um caso recente, chegamos a um adolescente que assaltou dois funcionários de uma empresa quando iam fazer um depósito e subtraiu R$ 50 mil. Esse adolescente foi encaminhado para a Vara da Infância e Juventude.” Ela ainda pontuou que câmeras e alarmes são positivos. “As câmeras servem colaborar com a identificação dos criminosos numa futura investigação.”