Câmara e PJF em descompasso
ACâmara Municipal marcou posição de independência frente ao Executivo no período legislativo de junho, que se encerrou ontem. A derrubada de quatro dos cinco vetos do prefeito Bruno Siqueira (PMDB) a projetos de leis originados no Palácio Barbosa Lima é apenas um dos sinais da tomada de posição do Parlamento, no qual o Governo Bruno vinha navegando em céu de brigadeiro desde o início de seu mandato. Dos 19 vereadores, apenas dois deles vinham marcando franca oposição na votação dos projetos de interesse da Prefeitura: Roberto Cupolillo (Betão, PT) e Wanderson Castelar (PT). Jucelio Maria (PSB), apesar de se dizer independente, também tem caminhado nesse sentido. Já neste mês, no entanto, dos quatro projetos vetados, três foram rejeitados com votos contrários apenas do líder do Governo Luiz Otávio (Pardal, PTC) e do vereador Julio Gasparette (PMDB). Nos bastidores, o movimento é visto como uma reação à decisão do prefeito de barrar o aumento dos parlamentares e também como um rearranjo de peças para as eleições de 2016.
Embora a votação dos vetos tenha sido arrastada por sequentes adiamentos, o presidente da Casa, Rodrigo Mattos (PSDB), admite que os ânimos podem estar mais acirrados diante da proximidade do fim dos mandatos, embora reconheça que houve falta de acordo em alguns casos. O líder do Governo, o vereador Luiz Otávio Coelho (Pardal, PTC), não nega a mudança de ânimos. Procurado pela Tribuna, ele afirmou que a situação “já era esperada”, mas atribuiu o descontentamento dos parlamentares às divergências entre os pareceres das procuradorias do Legislativo e do Município. Pardal também rechaçou que a derrubada dos vetos seja resultado de uma fragilização da base e adiantou que a Prefeitura poderá entrar com uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) contra as matérias promulgadas.
Dos quatro vetos rejeitados pelos vereadores, três estabelecem novas atribuições à Cesama, sendo de autoria dos vereadores Ana do Padre Frederico (PDT), Castelar e Antônio Aguiar (PMDB). O quarto veto diz respeito ao projeto do vereador Cido Reis (PPS) sobre o fornecimento de boletim médico aos pacientes de unidades básicas de saúde (UBS). Em todos os projetos de lei, os parlamentares alegaram ter buscado orientação antes da votação em plenário, inclusive por setores do Executivo, a fim de evitar que a matéria fosse rejeitada. Nas razões assinadas por Bruno, ele alega inconstitucionalidade ou ilegalidade das propostas, levando em conta artigos da Lei Orgânica do Município, além das constituições Federal e do Estado de Minas Gerais. O prefeito afirma ainda se tratar de interferência na iniciativa privativa do Executivo, na medida em que se cria atribuições e despesas.
“O Executivo tem sido muito rigoroso, através de sua procuradoria, em relação aos projetos dos vereadores. Às vezes, isso acarreta um número grande de vetos. É característico do Direito, mas se houvesse uma flexibilidade maior por parte da Procuradoria da Prefeitura, essa situação poderia ser evitada”, explicou o presidente da Câmara. Rodrigo relatou a dificuldade da manutenção de vetos, inclusive por administrações anteriores, mas descartou que a decisão esteja atrelada ao episódio do reajuste do salário dos vereadores. “Esta questão está superada”, disse. O veto ao aumento do subsídio dos parlamentares, de 8,17%, foi o único acatado nas sessões plenárias de junho.
No dia da aprovação de um projeto de lei do vereador José Emanuel (PSC), que previa a avaliação periódica das estruturas físicas de escolas municipais, um parlamentar aproveitou a situação e disparou, ao final da reunião: “acho que terão que fazer uma avaliação das estruturas da base do Governo também”, disse, arrancando risadas de alguns colegas. Embora não demonstre abertamente o quanto é delicada a conjuntura entre o Legislativo e o Executivo, o presidente da Câmara dá claros sinais que esta independência tende a se ampliar e consolidar. Após o episódio do veto ao reajuste do subsídio, Rodrigo prometeu que a Mesa Diretora iria se empenhar no pagamento do IPCA na negociação salarial entre servidores e PJF e inclusive já questionou a venda de terrenos da Empav para o suposto pagamento de dívidas com fornecedores. O vereador é um dos nomes cotados para vice-prefeito na disputa municipal numa possível coligação dos tucanos.
O secretário de Governo, José Sóter de Figueirôa, nega que a derrubada de vetos seja um sinal de afastamento da base, principalmente em razão da aproximação do período eleitoral. “Ainda não dá para dizer que está indo para o fim dos mandatos. Talvez no ano que vem. A coisa ainda está muito confusa, já que as regras do jogo eleitoral não estão bem definidas. É precipitado dizer que está havendo alguma coisa. Temos uma relação muito boa com o Legislativo”, assegura. Figueirôa classificou a derrubada dos vetos como problemas de ordem técnica, os quais serão avaliados caso a caso, “respeitando a harmonia, a independência e autonomia entre os poderes”, diz.
Sucessivos pedidos de vista pelo Executivo irritam parlamentares
O uso de manobras regimentais para adiar a votação de projetos de acordo com o interesse do Executivo também tem sido um dos pontos de discórdia entre alguns vereadores e o Governo. Em dez sessões realizadas, foram feitos 64 pedidos de vista, mais da metade dos projetos de lei da ordem do dia. Por razões distintas – técnicas ou políticas – os frequentes pedidos de vista surgiram, principalmente, por iniciativa do líder do Governo, Luiz Otávio (Pardal, PTC), que mobilizou a base para adiar a votação. A morosidade pela aprovação das propostas foi constatada pelos vereadores oposicionistas e da própria base.
Na reunião do dia 22, durante discussão da matéria que prevê a divulgação do cardápio da merenda em escolas municipais, do vereador André Mariano (PMDB), ficou nítida a insatisfação de companheiros da base com a demora da votação. “Estou pedindo vista da matéria, mas vejo que o vereador André, que é da base, já discutiu o projeto com o secretário de Governo e o de Abastecimento. Assim como essa Casa analisa com carinho os projetos do Executivo, eu pediria ao líder de Governo e à bancada para que olhassem a solicitação dos projetos de lei dos vereadores. E peço ao líder para que nossos projetos não tenham este constrangimento. Pediria à vossa excelência para que desse esse recado ao Executivo”, disse o vereador Nilton Militão (PTC).
Pardal respondeu ao colega. “Gostaria de lembrar que vossa excelência também é da base do Governo, o senhor está cumprindo o seu papel. Mas todo o procedimento tem que ser feito, para podermos buscar sempre o respeito a esses vereadores”, rebateu. Outro insatisfeito com as constantes suspensões de votação é o vereador José Emanuel (PSC). Em uma das votações de vetos enviados à Casa pelo Executivo, ele disparou. “O líder do Governo pede vista até em veto. Não tem uma coisa que passa aqui que não tenha que passar pela mão do Executivo. Estou muito assustado com essa situação. É veto direto e reto.” Pardal respondeu. “Diálogo supera qualquer situação.Não é vergonha nenhuma o líder pedir vista, para tentar achar um caminho para o acordo.”
Em entrevista à Tribuna, Pardal argumenta que a Prefeitura não tem qualquer interesse de adiar o processo de votação dos projetos ou aplicar vetos. Segundo o vereador, a liderança da base já se posiciona junto ao Executivo para dar agilidade ao processo e evitar desgaste entre os dois poderes. Já o secretário de Governo admite que há uma iniciativa do Executivo para reduzir custos. “No que tange à Prefeitura, temos evitado ao máximo mensagens que gerem gastos, e projetos de lei também. Se o valor for irrisório ao orçamento municipal, a gente despreza este impacto financeiro. Agora, tudo que traz grande impacto, com toda certeza. Até porque isso é vício de iniciativa.”