Medo perto de antigos hospitais
O corpo de um homem sem identificação encontrado nas antigas dependências do Hospital Doutor Aragão Villar e um incêndio de grandes proporções nas instalações do desativado hospital psiquiátrico Casa de Saúde Esperança jogaram luz, mais uma vez, sobre o estado de abandono no qual se encontram estas edificações. Soma-se à situação, a precariedade do imóvel que abrigava os pacientes da Clínica São Domingos. Nos três casos, o panorama é de insegurança para moradores ao redor. As estruturas são alvos de invasões, saques e pichações, além de servirem de local para consumo de drogas e de bebidas alcoólicas, práticas sexuais, abrigo de pessoas em situação de rua e esconderijo para criminosos.
Outra condição constatada pela Tribuna em todas as instalações é o acúmulo de sujeira, entulhos, vasilhames e outros objetos com capacidade para reservar água, aumentando as chances de surgimento de focos do mosquito Aedes aegypti. Para as comunidades do entorno, os transtornos, que se arrastam por cerca de dois anos, já eram para ter sido superados, pois são de conhecimento do Poder Público. Os moradores afirmam que a Polícia Militar é acionada diversas vezes para cada um destes locais em razão de roubos nas proximidades, algazarras, bebedeiras e perturbação do sossego. Cansada, a vizinhança almeja que seja dada uma finalidade aos prédios, até mesmo a demolição, na tentativa de minimizar os incômodos. Todas estas situações foram temas de reportagem da Tribuna em 2014 e 2015 e, apesar do tempo transcorrido, não houve alteração. A Prefeitura confirmou que os proprietários das edificações já foram notificados e que irá mover ações judiciais a fim de que os problemas sejam sanados.
Incrustada em uma grande área no Bairro São Bernardo, o extinto Doutor Aragão Villar é sinônimo de medo para os vizinhos. A edificação tem três andares totalmente depredados. As paredes foram destruídas e os cômodos incendiados. O imóvel não tem portas e guarnições e apresenta janelas quebradas. Ao caminhar por seus corredores, é possível encontrar documentos e remédios deixados desde a época do fechamento da unidade. Ainda é possível deparar-se com objetos que indicam que o local é ocupado, como garrafas e latas de bebidas alcoólicas vazias, preservativos, cachimbos improvisados de crack, roupas, cobertas e fezes humanas. Na parte externa, chama a atenção o mato alto, a incidência de mosquitos e vasilhames que servem como reservatório de água.
No Paineiras, onde situam-se as instalações da Clínica São Domingos, apesar dos acessos estarem todos fechados com grades e cadeados, ainda há pessoas que driblam os obstáculos, com o fim de utilizar o imóvel para usar drogas e consumir álcool. No espaço, é possível perceber mato alto, pichações, janelas com vidros quebrados e a existência de copos e potes, indicando a presença frequente de “visitantes”.
Já na Casa de Saúde Esperança, na Vila Ideal, o incêndio, registrado no último dia 13, destruiu um galpão de 80 metros quadrados, onde havia papéis, possivelmente documentos e prontuários médicos de antigos pacientes. Além de arquivos, o fogo danificou camas e armários. A suspeita é de que as chamas tenham sido provocadas de forma criminosa. Invasores teriam entrado no depósito pelo telhado e ateado fogo nos arquivos. Para os vizinhos, o local hoje funciona como atrativo para criminosos, deixando a comunidade vulnerável. Além disso, as instalações encontram-se envoltas à sujeira e ao mato alto e apresentam sinais de arrombamentos.
Tentativas de estupros e assaltos
O presidente da Associação de Moradores dos bairros São Bernardo, Cesário Alvim, Jardim do Sol e São Sebastião, Sérgio Neves, argumenta que o abandono do imóvel do Aragão Villar coloca a população em risco constante. “É o perigo de assalto, há prostituição no local e consumo de droga. Só que não há como a associação atuar ali, por ser uma área particular. As pessoas que vão até lá para dormir ou usar as dependências acabam levando vasilhames, garrafas e até pneus, contribuindo para a proliferação da dengue. A edificação, garantem os vizinhos, já foi alvo de diversos saques. Camas, portas, telhas e janelas foram levados do antigo hospital. “Hoje só tem o esqueleto. Depois que o corpo foi localizado, o medo aumentou. Além disso, no dia a dia, o cenário é complicado, pois há casos de indivíduos que ameaçam a pegar as meninas e arrastá-las lá para dentro. Tem o relato de uma moça que foi agarrada pelo braço, mas teve sorte porque um carro passou, e era de conhecidos. Eles acenderam o farol, fazendo os homens soltarem a moça”, ressaltou Neves. Em 11 de abril, o corpo de um homem foi encontrado nas dependências do Aragão Villar pela Polícia Militar, que registrou o encontro do cadáver que não apresentava sinais de violência.
Quem convive ao redor da antiga Clínica São Domingos passa pelos mesmos temores. “Eles pulam o portão e usam o local para beber, usar drogas e fazer sexo”, disse um moradora que não quis ser identificada. Outra contou que já viu um grupo sair de um trilha no meio do mato e invadir o local. “A gente fica com muito medo. Não sabemos quem são estas pessoas. Se apenas querem usar o local ou estão ali à espreita para praticar furtos e assaltos”, disse, acrescentando que há um zelador que aparece no imóvel às vezes, mas, mesmo assim, tem muita sujeira. “Não dá para saber como é o estado lá dentro. Tememos que haja focos do Aedes aegypti.
O sentimento de insegurança é sentido ainda pelos vizinhos da Casa de Saúde Esperança. O lugar também é alvo de invasões e saques. Quando a Tribuna esteve no local, no dia seguinte ao incêndio, uma dupla tinha invadido o imóvel, resultando no acionamento da PM. Os policiais vasculharam a edificação, mas ninguém foi localizado. De acordo com o cabo da 135ª Cia da PM, Fabiano Ribeiro, que atendeu a ocorrência, foi registrado um crime de dano, pois houve a constatação de portas e janelas quebradas, além de desordem nos arquivos de documentos do antigo hospital, que ainda conta com mobiliário e equipamentos do período em que funcionava. O militar ainda relatou que, por parte dele, já era o terceiro registro feito na casa. “Não há uma vigilância e, por isso, o local é muito visado para uso de drogas e furtos.” Para a comunidade, o medo é que o crimes de furtos estendam-se para a vizinhança.
Ação judicial da PJF contra os proprietários
Por meio de nota encaminhada à Tribuna, a Prefeitura esclarece que a Procuradoria Geral do Município (PGM) finaliza o processo referente ao Hospital Aragão Villar para mover uma ação judicial contra os proprietários do imóvel. Eles terão que realizar recomposição e reconstrução do passeio, fechamento do terreno com muro de 1,5 metros de altura (com a utilização de materiais próprios), capina, limpeza geral e retirada de lixo com destinação adequada. Conforme a nota, os proprietários já haviam sido notificados há um ano e meio para realizarem estes serviços, no entanto, nada foi feito. Por isso, além de responderem judicialmente, serão multados pela não prestação dos serviços.
Em relação à Clínica São Domingos, a PGM encaminhará, nos próximos dias, o processo para a Secretaria de Atividades Urbanas (SAU), solicitando a fiscalização do terreno para verificar se a notificação judicial foi cumprida. Caso os serviços exigidos como, restauração da cerca viva, retirada de materiais, capina, fechamento do imóvel e limpeza não tenham sido realizados, serão tomadas medidas judiciais. A realização desses serviços é de total responsabilidade dos proprietários do imóvel, que já foram autuados.
No que tange à Casa de Saúde Esperança, o responsável pela mesma já foi autuado várias vezes inclusive por não cumprimento de solicitação da Defesa Civil. O local inclusive passou por limpeza geral executada pela Prefeitura nos dias 28 e 29 de março deste ano, após o Comitê Gestor da Sala de Operações Contra a Dengue verificar a necessidade de limpeza para combater a proliferação do mosquito Aedes aegypti no imóvel.
A Tribuna conseguiu localizar os proprietários dos hospitais Aragão Villar e Casa de Saúde Esperança, mas preferiram não comentar sobre os fatos. No casa da Clínica São Domingos, a reportagem não conseguiu contato com os responsáveis.