Paulo Scott mostra sua estranheza em Mesmo sem dinheiro comprei um esqueite novo
Ao contrário do que pode parecer, a estranheza tornou-se um dos maiores e melhores adjetivos do escritor Paulo Scott. Seus tipos bizarros povoam elogiadas obras, como os contos de “Ainda orangotangos”, publicados em 2003, e o romance “Habitante irreal”, de 2011. Ainda que em uma linguagem em que tal recurso exige esforços mais complexos, o escritor também alcança a peculiaridade de personagens e situações em sua poesia, atividade das mais constantes em sua carreira. O último livro, “Mesmo sem dinheiro comprei um esqueite novo” (Companhia das Letras, 75 páginas), exibe um universo visceral, do qual o autor parece ter urgência em falar. “tendões atrofiam no homem de 45/ que passa o dia sentado escrevendo/ suas meias se gastam, é de encaixe/ e quando mais tarde, aos risos// meias, sempre se pode comprá-las”, escreve um eu lírico bastante próximo do autor de 48 anos.
Marca de sua prosa, o irreverente mau humor também ganha os versos, como em “Advérbios de pequeno corpo”: “espera-se do poeta que lave as mãos/ antes e depois de utilizar o mictório/ e não se distraia com o mau estado temporário/ (ou mesmo a má formação) dos azulejos/ na parede do banheiro quando houver/ azulejos na parede do banheiro e alguém/ aguardando à mesa”. Paulo Scott, a seu jeito, repensa a vida e também, como sempre, alfineta a própria literatura: “o que de tudo ficará? literatura?/ para que diabos serve a literatura/ quando você está feliz e tem amor?/ (amar é algo que não se completa)”.